Se eu desaparecer hoje E falo mesmo do meu corpo aqui tão sentado a escrever desde a ponta da língua à légua mais distante da minha vida, diz que compreendi. Diz que sei que nada está onde é certo estar Que o amor súbito é a escada para o entendimento Diz que fui ar azul sobre campos de secura estrada recta ao infinito, um acidente ao longe Que provei toda a sede quando engoli os homens Que queimei alegremente no ácido das palavras Que tombei em ricochete para que me vissem e que, quando me viram, me ergui animal Diz que me viste nua, sempre Que corri por hospícios de olhos fechados e a boca às avessas Que vivi mais ao alto do que em mundo plano e fui honesta na minha rente loucura Diz que nunca esqueci a subida a um plátano Que ninguém viveu no meu lugar, nem eu, no de ninguém Que fui o halo frio que preenchi com esta pena Pela minha ausência E que tudo o que disse foi com silêncio Diz que sei, sobretudo, que ardemos juntos como ventosas, Que o teu corpo me serviu de andar às pernas asmáticas Que te agradeço ter-te oferecido lírios Que me reduziste o nojo da espécie Diz que eu fui eu
Guarda-me este segredo que tenho largo por baixo dos cabelos: - quanto em mim fui que não vivi quanto em ti é que fui eu? Mas não te preocupes, não desapareço hoje Quando me conheceste já eu não existia e tu sabes que essas saudades que vais tendo são as minhas.